sexta-feira, 13 de julho de 2018

Aula 05 - Desmistificando Gênesis - Caim e Abel



“Cada um, dê conforme determinou em seu coração, não com pesar ou por obrigação,
pois Deus ama quem dá com alegria”. (2 Coríntios 9:7)

1 – Introdução

Sempre que começamos ler Gênesis, surgem diversas perguntas, curiosidades e até mesmo dúvidas a respeito das histórias contadas.
É comum, procurando por respostas, acharmos as mais absurdas conclusões teológicas na especulação do que seja certo e verdadeiro. No entanto, é preciso observar algumas referências a fim de encontrarmos o propósito de Deus na história da criação, sabendo que tudo o que foi feito, criado e dito, teve um propósito preestabelecido por Deus antes mesmo da criação do mundo.

2 – A Oferta

Antes de começarmos a falar sobre Caim e Abel, vamos recordar os acontecimentos diretamente ligados ao primeiro homicídio entre irmãos. Adão e Eva foram expulsos do Paraíso, o Jardim do Éden. Agora eles conhecem o bem e o mal, e reconhecem que estão nus, descobertos. E para que a nudez do homem e da mulher, isto é, para que o pecado deles fosse coberto, o sistema sacrificial é iniciado. O próprio Deus faz roupas de pele de animal para eles, derramando sangue pela primeira vez na história da humanidade. A “cobertura pelos pecados”, ou a remissão é estabelecida por meio do derramamento de sangue.
Deus havia prometido uma redenção por meio da mulher. De fato, quando o Eterno sentenciava a sorte da serpente, Ele prometeu: “Estabelecerei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o descendente dela; porquanto, este te ferirá a cabeça, e tu lhe picarás o calcanhar”. (Gn 3:15)
O plano da redenção contemplava um descendente da mulher, um filho, que estaria encarregado de derrotar a serpente e a sua descendência (sim a descendência da serpente, que aqui é símbolo de uma geração pecadora contumaz). Isto quer dizer que o inimigo também traria do homem uma descendência ímpia.
Só por curiosidade, no Novo Testamento, quando João Batista chama os Fariseus de “raça de víboras“, em Hebraico ele dizia זֶרַע צִפְעוֹנִים “descendência da serpente”.
E o capítulo quatro do Gênesis abre relatando o nascimento de Caim e Abel.
 “Então Adão teve relações sexuais com Eva, sua mulher; ela concebeu e deu à luz Caim, e declarou: Com a ajuda do Senhor, tive um filho homem. (Gn 4:1)
Caim foi o primeiro “homem nascido de humanos”.
O seu nome em Hebraico é  Qayin, que vem do verbo  qanah “adquirir” e significa “possessão”.
Com o nascimento de Caim, Eva imagina ou mesmo tem a “certeza”, de que a profecia se cumpriria nele. Ela esperava por isso, e certamente Caim cresceu ouvindo que ele era o fruto daquela promessa.
Mas passou o tempo, e nada aconteceu. Talvez eles esperassem que Deus os devolvesse ao Éden e que aquela vida dura pela qual agora viviam, fosse aliviada. Mas nada aconteceu.
Foi quando Caim teve uma idéia, oferecer a Deus uma oferta (Gn 4:3)
Quem sabe não era isso que estava faltando?!
E ele ofereceu alguns frutos da terra, e ao invés disso, Abel oferece uma ovelha. Mas não uma simples ovelha, ele oferece a melhor, um primogênito do seu rebanho, um animal perfeito. E isso agradou a Deus.

3 – O Primeiro Homicídio

A história de Caim não está demonstrada por acaso nas escrituras. Sua atitude para com seu irmão serve como um claro ilustrativo dos efeitos da queda sobre os seres humanos. Aquele ser criado para estar com Deus, criado para amar, prefere distância de seu Criador e dá lugar ao ódio, e os efeitos são completamente danosos. 
Gênesis prossegue a sua narrativa, e agora vemos a forma com que os filhos de Eva escolhem para servir a Deus. Caim se torna um lavrador da terra, e Abel pastor de ovelhas (Gn 4:2)
Esse verso traz um relato muito interessante. “Lavrador” em Hebraico significa “servo”. Veja que Caim era um “servo” da terra. Terra aqui é a palavra adamah, o mesmo material de que Adão foi feito. Adamah é a representação do próprio homem.
Caim era servo do homem, servia primeiramente a si mesmo. Era servo porque era dominado e servia à terra. Uma coisa é você trabalhar neste mundo para poder ter a sua sobrevivência com dignidade. Outra coisa é ser um servo do mundo.
O homem foi feito da terra, e o mandamento divino era para que o homem dominasse a terra, ou seja, que o homem tivesse domínio, controle próprio, e não que fosse dominado pelas coisas da terra (Gn 1:28)


O ofício escolhido por Abel reflete muito da sua humildade, do seu coração voltado para a obediência ao Senhor. Temos que compreender que os textos do Gênesis tem conotações simbólicas e espirituais fortíssimas.
Caim acreditava em si mesmo, pensava que era o Cristo (prometido por Deus) e quanto mais confiava na sua própria força, mais se tornava escravo de si mesmo. Imagine Caim crescendo, sendo ensinado por sua mãe de que ele traria a redenção ao pecado do jardim. Por isso, em sua oferta Caim traz vegetal.
Há uma tradição muito antiga, no meio Judaico, de que na “era messiânica”, não seria mais necessário o sacrifício de animais. E se Caim era o Messias, então o único tipo de oferta a ser oferecida seria a de vegetal.
Portanto, a oferta de Caim era a confissão da sua autossuficiência, de sua autoconfiança, de se declarar o Enviado de Deus. Mas como tudo isso não era verdade, ele não foi aceito. (Gn 4:3-4)
Já Abel, seguiu o exemplo do próprio Deus e sacrificou uma ovelha, remindo seus próprios pecados e foi aceito.
“Todavia, não se agradou de Caim e de sua oferenda; e, por esse motivo, Caim ficou muito irado e seu semblante assumiu uma expressão maligna. Então o Senhor abordou Caim: Por que estás furioso? E por qual motivo teu rosto está transtornado? Se procederes bem, não serás aceito? Entretanto, se assim não fizeres, sabe que o pecado espreita à tua porta e deseja destruir-te; cabe a ti vencê-lo!” (Gn 4:5-7)

4 – O Sinal de Caim

O que se segue todos conhecem. Caim, ao invés de repensar seu modo de vida, mata o irmão.
O sentimento aqui não era o de ciúme, mas de inveja. Ciúme deseja o que a outra pessoa tem, enquanto a inveja cria ódio contra quem tem o que você deseja. 
Quem cultiva esses sentimentos, cultiva também uma família marcada por eles. A família de Caim alcança as alturas da perversidade em sua época. Em Gn 4:19 nós vemos a primeira descrição de poligamia, uma perversidade sexual que volta a nos assombrar nos dias atuais. Foi Lameque, da linhagem de Caim, que iniciou essa aberração. O mesmo Lameque se gaba de ser um assassino ainda maior que seu pai (Gn 4:23-24). Há um simbolismo macabro nessa passagem (Gn 4:24). Lameque diz que se Caim foi ‘vingado’ sete vezes, ele deveria ser ‘vingado’ setenta e sete vezes.
Sete é o número da Aliança com Deus. Ao usar esse simbolismo, Lameque admite uma deformidade, uma caricatura macabra da Aliança divina. Ou seja, Lameque promove uma aliança demoníaca.
Esse tipo de aliança é muito mais grave do que o chamado “pacto com o demônio”. Não é algo imediatista, para ganhar algo (e perder tudo). Mas é uma relação profunda e sem volta com Satanás. Uma servidão escolhida e abraçada por ele livremente.
“E pôs o Senhor um sinal em Caim, para que o não ferisse qualquer que o achasse”. (Gn 4:15)
Aqui o texto em Hebraico diz, “E colocou o Senhor em Caim um sinal“. Há muita especulação sobre o que seria esse sinal, mas o que podemos dizer é que geralmente na Bíblia, “um sinal“ significa algo que é miraculoso, que aponta para o futuro. A marca de Caim não era algo físico, não era a cor da pele, não era a raça, não era algo no DNA, era o pronunciamento de Deus a respeito da sua descendência, dizendo que ninguém o mataria e que ele frutificaria na terra, deixaria uma geração.
O fato é que Deus poderia ter acabado com Caim, ali mesmo, pois ele era merecedor de um castigo capital por tentar enganar o Criador, o dono da vida. Mas a misericórdia do Eterno foi muito grande.
5 - Conclusão
Nos dias atuais, as coisas não são muito diferentes. O diferencial é que, ao contrário daquele tempo, em que a linhagem de Caim é praticamente deixada de lado como uma insignificante parte da humanidade, as atitudes do mundo moderno não deixam dúvidas: a linhagem de Caim hoje é numerosa e poderosa, dominando os meios de comunicação e cultura, e se espalhando pelo povo com poucas barreiras pelo caminho.
É fácil comprovar essa afirmação. Pelas ações reconhecemos a quem a pessoa serve.
O que mais tem acontecido nos tempos modernos, senão a mais completa degradação?
A história de Lameque, sua poligamia e violência, confirma o que a Tradição sempre afirmou: a luxúria, quando desmedida e sem limites, vem sempre acompanhada de violência.
A quem vamos servir? Que caminho escolheremos para a nossa vida? Qual é o impacto dessa escolha para a nossa vida e para o próximo? Esse é o tipo de pergunta que não fazemos, pois queremos viver de prestígio, cobiça, e prazer. Sintomas compatíveis com a marca de Caim.


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